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sábado, 6 de setembro de 2014

JUSTIÇA E FÉ (*)


Luiz Carlos Formiga



“O Pai não quer que o ímpio se perca, mas se converta e viva...”

A justiça é a primeira virtude das instituições sociais, o fundamento da estrutura social. Todas as decisões devem sujeitar-se aos limites impostos pelos seus Princípios. O terreno primário no qual ela opera é a distribuição de nossos bens, dando a "bens" um sentido amplo, que inclui muito do que aspiramos: liberdade, oportunidades, posição social, riqueza....
Deus cria constantemente e embora criasse iguais todas as almas elas não o foram ao mesmo tempo. Desta forma cada uma vive há mais ou menos tempo, e, por consequência pode ter feito aquisições diversas..  A diferença entre elas está na diversidade dos graus da experiência alcançada e da vontade (livre arbítrio) com que realizam suas ações.
A desigualdade das condições sociais não é lei da natureza e desaparecerá quando o egoísmo e o orgulho deixarem de predominar. Neste momento, restará apenas a desigualdade do merecimento.
Numa sociedade justa, a distribuição de bens estará na dependência dos princípios de justiça refletidos no sistema de direitos, leis, processos e posições que faz da sociedade uma entidade política funcional.(1)
A Teoria Tridimensional de Miguel Reale pressupõe que é impossível conceber as leis, independente dos acontecimentos sociais, dos costumes, da cultura, das necessidades da sociedade, do Fato Social, levando em consideração os seus valores.
Reale vê o Direito como um evento cultural. Inova na sua tridimensionalidade, ao instituir entre os fatores da práxis jurídica uma interação dialética.
O Direito não é um esboço lógico, uma mera abstração, devendo ser compreendido em seu aspecto prático, como elemento social, cotidianamente vivenciado na práxis e aplicado em prol do bem-estar do grupo social, de sua evolução, como uma resposta aos desafios do dia-a-dia. Como os acontecimentos sociais se sucedem de forma imprevisível, não é possível imaginar o direito como uma coisa estática, mas como o resultado de um movimento dialético, sendo escrito, diante dos acontecimentos que oscilam no tempo e no espaço. Com esse enfoque é que as normas devem ser analisadas e sintetizadas, com o objetivo de atender as expectativas do universo axiológico.
A base da justiça segundo a Lei Natural, Divina, é querer cada um para o outro o que quereria para si mesmo.  No coração está depositada a regra da verdadeira justiça, fazendo que cada um deseje ver respeitados os seus direitos. Na incerteza de como deva proceder trate o homem de saber como quereria que com ele procedessem em circunstância idêntica. O guia seguro é a própria consciência. Na Lei Humana, uma norma é válida quando todos aqueles que por ela possam ser afetados a aceitam, após livre participação em um discurso prático que conduziu ao acordo, sem coação.
Um dos princípios fundamentais de justiça é a liberdade. Quando qualquer pessoa é privada de liberdade, todos os outros estão ameaçados. Este princípio não pode exigir a oferta incondicional da liberdade total a todos, mas, a de cada um deve ser contida pela necessidade de proteger a do próximo. A liberdade de uma pessoa só pode ser diminuída na medida em que este cerceamento constitui parte essencial de um sistema de liberdades que torne máxima a liberdade de todos.
Os direitos naturais são os mesmos para todos os homens. Mas, os direitos que os homens estabelecem morrem com as suas instituições.
Um segundo principio da justiça é o da diferença. Com base nesse princípio é que as desigualdades sociais e econômicas devem ser organizadas de forma que tragam os maiores benefícios aos menos favorecidos e possam propiciar funções e posições acessíveis a todos em condições de uma justa igualdade de oportunidades.
Perante o Criador são iguais todos os homens, e tendem para o mesmo fim.  Quando dizemos "o sol luz para todos" enunciamos uma verdade maior e mais geral do que pensamos.
Qual seria o caráter do homem que praticasse a justiça em toda a sua pureza? O do verdadeiro justo, porquanto praticaria também o amor e a caridade, sem os quais não há verdadeira justiça. A caridade se entende como benevolência, indulgência e o perdão das ofensas.
O amor e a caridade são o complemento da lei de justiça, pois amar o próximo é fazer-lhe todo o bem que nos seja possível e que desejáramos nos fosse feito. O amor ampliado até aos inimigos entende-se como o perdão e a retribuição do mal com o bem.
A Lei Humana é escrita, com base na ética e moralidade e a justiça possui sentido social e corretivo.
“O Céu e o Inferno ou a Justiça Divina Segundo o Espiritismo”, de Allan Kardec (2), é um tratado jurídico-filosófico que descreve: o processo, as partes, o sistema jurisdicional, as penas e os gozos. Ele discute com profundidade os  valores ético-espíritas.
A vertente materialista da ciência poderia explicar a natureza humana dizendo que somos impulsos eletroquímicos num biocomputador, que se originou por acaso num universo de partículas materiais mortas e que se movimentam aleatoriamente. A consequência natural é o “nada”. Para a vertente espiritualista, o homem é visto como um ser criado, de natureza biológica, psicológica, social, onde se inclui o cultural, e espiritual, dotado de historicidade e de livre arbítrio, encontrando-se em contínuo processo evolutivo, sendo parte integrante do universo, com o qual interage constantemente. A consequência é “morreu”, começou um novo estilo de vida.
Considerando que a alma humana é o maior investimento divino, podemos asseverar que as características desta teoria espírita são a isonomia de tratamento e igualdade de oportunidades. Nela há permissão ao Espírito da construção da herança de si mesmo, em oportunidades infindas, podendo sempre melhorar sua densidade perispiritual.
No tratado espírita 2), encontra-se um mecanismo constante de distribuição da justiça, pois há avaliação imediata do comportamento do Espírito, não sendo realizada apenas no Juízo Final. São examinados na origem os pensamentos, palavras e ações, havendo ainda neste processo a participação ativa de Espíritos Superiores, que nos auxiliam também na fase de planejamento, após a de escolarização.
A fase de escolaridade consiste em atualizar a consciência, com fatos das diversas reencarnações e reestudar os procedimentos. Na fase de planejamento, elaboramos as bases da nova reencarnação, dentro dos limites das possibilidades, méritos e das leis das probabilidades. Isto significa um não ao fatalismo e um sim ao determinismo relativo. Neste estilo de vida, sempre concluímos que verdade liberta, mas apenas a pacificação redime. No plano espiritual, o “estado do espírito” é caracterizado pela consciência, pelo crédito moral (bônus hora) e pela densidade perispiritual. Esta densidade está sendo determinada agora, com os nossos atuais pensamentos, palavras, atos e intenções. Como restituição ao nosso comportamento, frente às Leis Naturais teremos heranças correspondentes. (4)
Emmanuel, através da mediunidade de Chico Xavier, nos fala de “doenças escolhidas” (5)
“Seja na ingestão de alimento inadequado, por extravagâncias à mesa, seja no uso de entorpecentes, no alcoolismo mesmo brando, no aborto criminoso e nos abusos sexuais, estabelecemos em nosso prejuízo as síndromes abdominais de caráter urgente, as úlceras gastrintestinais, as afecções hepáticas, as dispepsias crônicas, as pancreatites, as desordens renais, as irritações do cólon, os desastres circulatórios, as moléstias neoplásicas, a neurastenia, as enfermidades degenerativas do sistema nervoso, além de todo um largo cortejo de sintomas outros, enquanto que na crítica inveterada, na inveja, no ciúme, no despeito, na desesperação e na avareza, engendramos variados tipos de crueldade silenciosa com que, viciando o próprio pensamento, atraímos o pensamento viciado das Inteligências menos felizes, encarnadas ou desencarnadas, que nos rodeiam.”
A lei natural atuará na programação do biocomputador para que tenhamos a melhor provação de acordo com nossas necessidades espirituais e refletindo a herança produzida por uma lesão que o próprio indivíduo tenha causado ao seu corpo físico. As mutilações de nascença têm sua causa em atos praticados no passado. Um atentado contra o cérebro necessitará para refazê-lo, de no mínimo, duas existências corporais.
Outro tipo de herança é a psicológica-biológica. Aqui, são as características de personalidade que se refletem no psicossoma e deste no corpo. O cérebro estará prejudicado para a nova experiência corporal, havendo transtornos mentais.
Alguns espíritos podem se recusar a evoluir e estacionar em modelos repetitivos de comportamentos, como, por exemplo, a tendência suicida, entre outros. Este padrão se reflete no corpo espiritual e físico-cerebral originando reações neurofisiológicas, que o levam a compulsões, obsessões.  Dentre as provas que repetirá se incluirá a extrema tentação ao suicídio na idade precisa.
Existem homens capazes de resistir a desgraças horríveis enquanto outros se suicidam depois de aborrecimentos ligeiros. Seria importante investigar a causa desta fragilidade/resistência e o que contribui para essa estrutura em termos de inteligência emocional e espiritual.
Nas épocas em que a vida é menos dura é que as pessoas a abandonam com mais facilidade. Em situações altamente dramáticas, como nos campos de concentração, o número de suicídios é bem pequeno. Para ganhar a liberdade o indivíduo atravessa a barreira de arame farpado. Há risco mais elevado de suicídio na presença de doenças mentais (alcoolismo, transtorno bipolar) e entre adolescentes grávidas e na epilepsia.
Qualquer infração, agressão ou desrespeito à Lei faz desbloquear automaticamente o sistema de reparação, elaborado com base nos valores morais. Desta forma o sistema avalia: a vontade, a responsabilidade e o mérito pessoal. “Vai e não erres mais para que não te sucedam coisas piores...”
A Lei Natural está gravada no disco rígido do biocomputador, diretório rotulado de consciência. Como não somos apenas impulsos eletroquímicos numa máquina que se originou por acaso, num universo de partículas que se movimentam aleatoriamente, temos que nos instruir e aprender a discernir o Bem e o Mal. Podemos considerar valores do Bem tudo o que contribui para a perfeição integral do ser e para a realização de seus fins existenciais como pessoa.
Com a lei imutável, a justiça preside a avaliação dos atos na consciência. Essa lei é de aplicação maleável e é utilizada como mecanismo básico, isonômico e indistinto, para que ocorra a perfeita administração neste julgamento de ações face ao réu no processo. A Lei de Causa e Efeito  não castiga, também não premia, no entanto restitui. É educativa, flexível, dinâmica e individual: “quem com ferro fere, com ferro será ferido”.
Na ética espírita, a razão é  meio de estabelecimento e a ação inteligente consiste em discernir o bem do mal. Com o auxílio de “O Livro dos Espíritos” (3) dizemos que “bem” é tudo o que é conforme à Lei de Deus e o mal, o que lhe é contrário e o discernimento  aclara com o progresso intelectual.
A Lei Divina, Natural, é um conjunto de Leis Físicas e 10 morais, sendo regras de bem proceder. A responsabilidade aumenta na medida da razão da capacidade de compreender o bem e o mal. O progresso pessoal conduz à melhor compreensão e aplicação, adquirindo mais perfeição e com isso aumentando também a soma de felicidade.
No livro citado, Kardec (2) descreve as fases processuais: exposição de fatos; a motivação; as infrações penais; os depoimentos, e a pronúncia da sentença, que pode ser enérgica, mas com misericórdia.
Chico Xavier lança luz sobre esse segundo qualificativo dizendo: “quando temos dívida na retaguarda, mas continuamos trabalhando a serviço do próximo, a Misericórdia Divina manda adiar a execução da sentença de resgate até que os méritos do devedor possam ser computados em seu benefício”. (**)
Na Lei Humana, enérgica mas justa,  existe o cuidado de apontar causas gerais de exclusão de antijuricidade, ilicitude, como, por exemplo, a legítima defesa, o estado de cumprimento do dever legal, o exercício regular de direito e o estado de necessidade.
Alem da abrangência universal, imaterialidade na execução, total poder de sanção, administração perfeita, instância única e absoluta, na Lei Divina não existe a possibilidade de recursos protelatórios.
A Justiça Divina apresenta características que são fundamentais. Ela é efetiva, sempre buscando o melhor resultado;  eficaz produzindo o efeito esperado e  eficiente cumprindo o prometido, que é a reeducação do espírito imortal.
Jesus lança Luz e Kardec trabalha, como potente refletor. (6)
Ante a Revelação Divina, Jesus diz: “eu não vim destruir a lei“
Espiritismo: “não venho destruir a lei cristã, mas dar-lhe execução.”
Jesus exalta a Lei de Amor: “amai-vos uns aos outros como eu vos amei.”
Espiritismo: “fora da caridade não há salvação.”
O Mestre destacando a necessidade do progresso: “não oculteis a candeia sob o alqueire.”
Espiritismo: “para ser proveitosa, a fé tem que ser ativa; não deve entorpecer-se.”
Salientando o impositivo da educação: “sede perfeitos como é perfeito o vosso pai celestial.”
Espiritismo: “reconhece-se o verdadeiro espírita pela transformação moral e pelos esforços que emprega para domar inclinações menos éticas (infelizes).”
Apontando a evolução: “ninguém poderá ver o reino de Deus se não nascer de novo.”
Espiritismo: “nascer, morrer, renascer ainda e progredir sempre, tal é a lei.”
Zaqueu, lá na época do Cristo, foi excelente exemplo de conduta equilibrada diante das Leis Humanas e Leis Naturais. (7)
Hoje, “kardequizar” é o mesmo que tornar explícita a reencarnação, verdade axiomática evidente por si mesma. Esta é única filosofia que pode enfrentar o materialismo, causador de todos os males atuais. Com o Espiritismo descobrimos que somos arquitetos do próprio destino. Eu sou o único culpado pelos males que me afligem. Religiões diversas enfrentam um grande desafio, porque é muito difícil levar Deus aos corações, sem pensar em reencarnação.
“O Criador concede às criaturas, no espaço e no tempo, as experiências que desejem, para que se ajustem, por fim, às leis de bondade e equilíbrio que O manifestam. Eis por que, permanecer na sombra ou na luz, na dor ou na alegria, no mal ou no bem, é ação espiritual que depende de nós.” (8)
(*) Clique e ouça. Com o belo e o bom, a letra vai levá-lo à reflexão. (9)


Referências bibliográficas

1.  Dores Valores Tabus e Preconceitos. Cap. “Aids: uma reflexão espírita da justiça”. P 39-48. CELD Editora.
2.  O Céu e o Inferno.
3.  O Livro dos Espíritos
4.  Seria eu, por acaso, um espírito?
5.  Emmanauel. Religião dos Espíritos, lição “Doenças Escolhidas”, psicografia de Francisco C. Xavier.
6.  Emmanuel. Jesus e Kardec. Psicografia de Francisco C. Xavier. Transcrita do Reformador, abril de 1957. Edição Comemorativa do Centenário de “O Livro dos Espíritos”. Reformador, p. 205, outubro de 1983.
7.  Queria ter um filho assim!
8  Emmanuel. Justiça Divina, lição “Diante da Lei”, psicografia de Francisco C. Xavier.

1 Comentários:

  • Não é sem propósito que Kardec no Capítulo XI do O Livro dos Espíritos colocou "Da Lei de Justiça de Amor e de Caridade". Não conseguimos conceber JUSTIÇA sem AMOR e CARIDADE e na abrangência que lá é retratada, não conseguiremos exercer justiça plena em apenas uma existência e o Pai nos proporciona a pluralidade das existências e só assim compreenderemos a Boas Aventuranças ensinadas por Jesus. Em quanto tempo adquiriremos a justiça só depende de nós de usarmos a VONTADE e seguir os ensinamentos do Mestre Jesus. E como diz Marielza "O sonho terminando no futuro." Marcos Fonseca

    Por Blogger Marcao, às 7 de setembro de 2014 às 05:22  

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