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sexta-feira, 8 de abril de 2011

DELITOS DA INTOLERÂNCIA

LUIZ CARLOS FORMIGA



A Liberdade como Termômetro

Na Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro se resolveu criar a Delegacia de Crimes Raciais e Delitos de Intolerância – DECRADI, com a finalidade de combater todos os crimes praticados contra pessoas, entidades ou patrimônios públicos ou privados, cuja motivação seja o preconceito ou a intolerância. Um termômetro examina a febre da intolerância. Março 2011, o Deputado Átila Nunes conseguiu aprovar, apesar de votos contrários, o Projeto de Lei nº 1609/2008.


Na justificativa o deputado diz que "o Rio de Janeiro, apesar de ser tão liberal, é quem mais registra casos de discriminação e preconceito racial. Denúncias de racismo são registradas a cada 15 dias nas delegacias do Rio de Janeiro" Ele afirmou ainda: "a freqüência com que esses crimes ocorrem justificam a criação de uma delegacia especializada." Compete à DECRADI, registrar, investigar, abrir inquérito e adotar os demais procedimentos policiais necessários, nos casos que envolvam violência ou discriminação contra as pessoas, objetivando a efetiva aplicação da Legislação em vigor e assegurar os direitos de todos os cidadãos, independente de cor, raça ou credo religioso. A liberdade de religião é muito importante para a humanidade, sendo um dos pilares dos direitos humanos e da Democracia. Pode ser utilizada como termômetro para avaliação do grau de democracia e cultura de um povo.


Não basta que a sociedade nos declare iguais, é também necessário que nos aceite diferentes. Deve ser garantida num Estado Democrático de Direito. Não podemos carregar explosivos junto ao corpo em nome de Deus. Redobremos a vigilância. Intolerância não é doença contagiosa, mas é contagiante. O primeiro arcabouço sustentador do direito constitucional é o princípio da legalidade. Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude da lei. A expressão exterior da liberdade religiosa é uma forma de manifestação do pensamento. Na coexistência vamos encontrar liberdades: a de crença; de culto e de organização.


Da liberdade de crença surge a de escolha (ou não) da religião, a liberdade de aderir a qualquer seita religiosa, a liberdade (direito) de mudar de religião. Há limites, pois essa liberdade não compreende a de embaraçar o livre exercício de qualquer religião, de qualquer crença, uma vez que vai até onde não prejudique a dos outros. A intolerância produz marcas infamantes aponta para o desconhecimento do universo do império da lei (4). A tentativa de transformar as religiões afro-brasileiras em "seitas diabólicas" cria um estigma. Este ato favorece o preconceito e é ofensa ao princípio constitucional da dignidade da pessoa humana. O Brasil é país laico e o Estado não interfere nem mesmo na liberdade de descrença dizendo que "todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza. É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e suas liturgias".


Por outro lado, a liberdade religiosa, de crença ou de culto não é um valor absoluto, nem tampouco um direito absoluto. Há limitações sobre este direito/valor social. Até os direitos fundamentais devem sofrer "restrições" quando ultrapassem e colidam, ainda que aparentemente, com outros direitos fundamentais. O Estado e a sociedade têm o dever de procurar uma convivência harmoniosa entre as religiões, de modo que não haja tratamento desigual entre as formas de religião e nem o fomento de discriminação e/ou preconceito de uma religião pela outra. A conquista constitucional da liberdade religiosa é verdadeira consagração de maturidade de um povo. É verdadeiro desdobramento da liberdade de pensamento e manifestação.


O constrangimento feito de modo a conduzir à renúncia de uma fé representa, dentre outros, desrespeito à diversidade espiritual. Democracia onera o tempo e ainda temos que trabalhar para conseguir contornar o poder neurótico (2,3). Em 1964, “pessoas” me induziram a ler o Manifesto Comunista e o achei muito interessante. No entanto, gostei mais do Manifesto do Sermão da Montanha. Na época vivenciava ambientes diversos, espírita-acadêmico na UEG (UERJ) e aluno do CPOR. "Pessoas" me fazem recordar palavras do jurista: "o novo Código Civil começa proclamando a idéia de pessoa e os direitos da personalidade. Não define o que seja pessoa - o indivíduo na sua dimensão ética, enquanto é e enquanto deve ser".


Miguel Reale leciona que "a pessoa é o valor-fonte de todos os valores, sendo o principal fundamento do ordenamento jurídico". Sendo objetivo, devo recordar que "uma pessoa só tem liberdade religiosa se puder optar num ou noutro ponto de vista, sem perder sua dignidade como cidadão. A liberdade de crença e religião, sendo preservadas, aprimoradas e estendidas a todos os indivíduos, trará ainda maior evolução dos direitos e garantias individuais, que conduzem à justiça social e à paz entre os povos".


Nesta hora é necessário que haja a possibilidade de comunicação com outras “pessoas” e conseqüentemente ter acesso a diferentes pontos de vista. Num Estado de Direito, a liberdade religiosa só tem sentido em condições de reciprocidade e o direito de igualdade pressupõe o direito à diferença. Na "Ética da Tolerância" (5) recorremos a Jesus: "Os meus discípulos serão conhecidos por muito se amarem." É a lição de que o progresso do conhecimento é estimulado pelo regime de diálogo franco e aberto. É convite à fraternidade, ao amor em ação, na aceitação da diversidade e no relacionamento pacífico entre os diferentes.


(1) O Termômetro e os Direitos Fundamentais http://www.institutoandreluiz.org/ca_luis_carlos_formiga.html


(2) A Mulher do Próximo. Do Delito e das Penas http://www.cefamiami.com/newsletter/materias/artigo/05.04/index.html


(3) Apego ao Cargo. O Poder Neurótico. http://orebate-jorgehessen.blogspot.com/2011/03/apego-ao-cargo-o-poder-neurotico.html


(4) Torres Gêmeas Afro-brasileiras. Preconceito, Estigma, Mídia e Ordenamento Jurídico http://www.morhan.org.br/artigo_formiga.html


(5) A Aristocravia Intelecto-Moral. Ética e Terceiro Milênio http://www.espirito.org.br/portal/artigos/neurj/retrato-de-bezerra.html

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